8 de dez. de 2012

Alagamento: Um depoimento encharcado

Aproximadamente às 16 horas da tarde, na cidade de Campo Largo, tudo ia bem. Naquela manhã tinha abraçado minha mãe de forma mais forte do que o normal. Ela ia fazer uma de suas primeiras trilhas, uma escalada ao topo do Pico do Paraná. Estava meio apreensiva com tudo aquilo, mas ela estava decidida, e estava em mãos competentes.
Meu pai me buscou em casa e fomos almoçar com minha irmã e minha madrasta. Deixamos minha irmã na casa da minha avó e pegamos estrada para Campo Largo, onde minha madrasta reside, e onde ela iria trabalhar em um casamento mais tarde. Meu pai e minha madrasta aprontaram tudo para que eu e meu irmão postiço ficássemos sozinhos. Tinha janta congelada, cama arrumada, TV e computador prontos. Estivera nublado o dia todo, mas com um calor infernal, que perdurara a semana inteira.
Em questão de minutos, o tempo virou drasticamente. Eu observei, passiva, com o netbook do meu pai sobre o colo, enquanto as nuvens se movimentavam de forma assustadoramente rápida, quase como um ciclone. Então, a chuva e a água tomaram conta do mundo. Era um pouco desesperador. Era quase impossível ver muito a frente. Senti-me a frente de um dilúvio. Depois tudo começou a encher e encher. Toda aquela água cristalina caindo do céu, formando uma piscina na frente da casa, começou a parecer um sonho. Sempre que eu via enchentes na TV quando pequena, pensava como seria incrível ver uma enchente. Um dia de sereia, poder ir nadando à todo lugar! O que poderia ser melhor do que isso?
Então tomei coragem e pedi ao meu pai que me deixasse ir ver a chuva. Ele deixou. Me molhei toda, até os ossos, mas estava feliz quando cheguei ao portão e vi toda aquela água lavando o suor dos corpos deixados pelo Sol. Voltei para dentro de casa, e voltei a digitar tranquilamente minha fanfic. Daqui a pouco, não consegui ficar parada e fui até a porta. A água avançara e subira mais um pouco. Já me batia nos joelhos. Dali a pouco entrei por um segundo para checar o Facebook.
Só ouvi minha madrasta rindo e fui ver o que estava acontecendo. A água estava vindo para dentro e começamos a nos desesperar. Mas de leve. Não esperávamos a proporção que tudo tomou. Tentamos conter a água com rodos e vassouras, mas ela avançou. O desespero retornou. Começamos a recolher tudo o que estava pelo chão na lavanderia e na cozinha. Mas o estado se deteriorou. A água que entrava em casa já não era mais só da chuva. Agora água de bueiro vinha na nossa direção, com todo o sortilégio de itens desprezíveis boiando. Antes que eu percebesse, já perdera a conta de besouros e baratas que passaram por nós. E a água não parava de subir. Comecei a desesperadamente tirar tudo das tomadas e colocando-as para cima.
A água subia. Então eu ouvi gritos e corri para a cozinha. Minha madrasta gritava.
-Meus livros! Minhas roupas!
Ela começou a chorar. E todo aquele desespero me alcançou. E se fossem os meus livros e as minhas roupas? E se nunca pudéssemos repor nada daquilo? Então me lembrei da minha mãe, no topo daquela montanha... Nunca tinha me sentido tão impotente, correndo para recolher tudo que estivesse ao alcance das águas. Só depois que a chuva parou que pudemos nos mexer. Desentupimos os ralos, e a medida que a água se esvaia, a lama aparecia. Era um cenário meio apocalíptico.
Levamos quase uma noite inteira para reparar o que a água estragou em menos de 20 minutos. Puxando água com o rodo, passando pano, e limpando a terra do chão. Jamais teria pensado que uma enchente poderia ser tão ruim se não tivesse vivido. É algo que não desejo para ninguém.

Skitter - A Maluca do Blog

Um comentário:

  1. Desespero heim? Relato incrível e super bem escrito... me vi vivendo o mesmo, tal a eloqüência! Um abraço, S.

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