23 de ago. de 2012

Pedalinho


-Você é muito lerdo. Quer fazer o favor de ajudar?
-Eu sou lerdo? Você que é a gora que está atrasando a gente. Aliás, porque é que você está na direção?
-Porque você não tem coordenação e nem inteligência para isso. É só mão de obra barata.
Ela disse, rindo. E lá estavam os dois, no pedalinho, no meio do lado, longe dos olhares maldosos e/ou julgadores, a não ser, é claro, por um ou dois patos, com inveja da envergadura do seu cisne gigante. O único lugar onde amigos podiam ser amigos sem serem incomodados. 
-Mulher no volante... Não sei não...
-Pedala aí e fica quieto seu ogro machista.
Ele parou de pedalar e cruzou os braços.
-O que foi?
-Estou de greve.
Ditou, fingindo irritação.
-Você não pode fazer greve! Estamos no meio do lago! Preciso de você.
-Agora precisa da mão-de-obra barata?
-Pedala logo.
Ela disse, socando seu braço e rindo.
-Agressão! - Ele gritou, segurando seu pulso. Seu grito ecoou pelo lago, assustando alguns patos que nadavam tranquilos. Ela riu e corou, morrendo de vergonha, apesar de ninguém por perto poder ouvi-los. - Opressão! Violação dos direitos humanos! Exijo melhores condições de trabalho!
-Fica quieto!
Ela disse, empurrando-o. A portinha do barco se abriu, ele gritou, e quando ela viu, a água já o tinha engolido.
-Fred! Não pode nadar aqui! - Ela avisou, gargalhando com a coincidência. Por baixo d'água, ele contornou o barco para o lado dela. - Fred? - Chamou, quando viu que ele não vinha a tona - Não tem graça, Fred!
De repente, ele pulou para fora, tentando alcançá-la coma  mão cheia de lodo do fundo do lago. Ela gritou, com nojo, pulando para a frente do banco em forma de cisne, agarrando-se ao pescoço do bicho de compensado.
-Cora! Desce daí! Eu estava brincando!
Ele disse, preocupado.
-Não! Você vai me molhar...
-Não vou Cora. Cuidado, você vai...
Tarde demais. O barco, não projetado para sustentar tanto peso em uma extremidade, virou, levando Cora para baixo com ele.
-Cora!
Fred gritou, lançando-se ao resgate. Do outro lado do barco, Cora emergiu, tossindo e cuspindo água barrenta. Fred surgiu ao lado dela.
-Ei, você está bem?
-Claro que não! - Ela disse irritada - Acho que eu bati a cabeça...
Gemeu.
-Vem, me ajuda a virar o barco e eu te levo para casa.
-Me leva para o hospital...
Pediu. 
-Deixa de frescura.
Fred disse, empurrando o cisne até que ele voltasse à posição vertical. Ele ajudou Cora a subir e nadou até o outro lado para subir na direção. 
-Achei que eu estava dirigindo...
Ela reclamou.
-Você não tinha batido a cabeça e queria ir para o hospital?
-Bati. Mas ainda sou mais coordenada que você. - Ele sorriu e ela sorriu com ele, de leve, com dor - Quer que eu pedale?
-Não precisa.
Sua voz tinha mudado completamente. Parecia mais... Macia. Eles ficaram em silêncio por um tempo.
-Está doendo?
-É claro que está!
Ela disse, furiosa dele tê-la feito virar o barco, bater a cabeça e ficar encharcada. 
-Foi sem querer está bem? Eu não sabia que você ia ser idiota o bastante para virar o barco!
-Eu fui a idiota? Se você tivesse pedalado, NADA disso teria acontecido.
-E como eu ia saber que você ia me empurrar para fora?
-E como eu ia saber que a porta ia abrir?
Bravos, tentando culpar um ao outro por algo que claramente fora uma armação do destino, eles ficaram quietos. Enquanto os pensamentos de Cora corriam em círculos irritados e doloridos, os de Fred voavam realmente longe.
-Cora... A gente é amigo desde pequeno né?
Ela assentiu.
-Desde que você atirou aquela bola estúpida no meu rosto e quebrou meus óculos.
Ele riu.
-Você ficava horrível com eles.
Ela riu com ele.
-Tenho que concordar.
Eles ficaram quietos novamente. Com apenas Fred pedalando, eles mal saiam do lugar.
-Você... Você acha que essa pancada na cabeça pode te causar uma amnésia?
Ela riu.
-Não sei... Daonde tirou isso?
-É que... Eu não tenho certeza se quero que você esqueça isso.
Disse, inclinando-se para ela. 

Um comentário:

  1. nossa, Skitter!
    gostei bastante do pedalinho. E engraçado e divertido.
    amei.

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